Fotos: Vinicius Becker (Diário)
O pintor predial Marconi Fillipin Campodonio, 39 anos, vive na Rua Canário, em Santa Maria. É um dos moradores que ainda permanecem na comunidade após a demolição da maioria das residências, que estariam desabitadas. A ação foi iniciada em julho, pela prefeitura, para impedir a reocupação de imóveis que eram de propriedade das famílias que integram o Aluguel Social ou realizaram a compra definitiva de outro imóvel. Agora, ele e vizinhos relatam uma rotina marcada pelo acúmulo de entulho. Conforme levantamento do Executivo, 14 famílias ainda estão no local.
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Segundo Marconi, os moradores precisam lidar diariamente com os escombros deixados pelas obras, sem orientação ou apoio da prefeitura.
– Depois das demolições, ficou tudo para a gente limpar. Entulho, canos quebrados, restos de paredes… A prefeitura não nos dá ajuda nenhuma. Estamos cercados de lixo e tentando sobreviver como podemos – afirma.

Além do acúmulo de entulhos, a comunidade enfrenta problemas antigos, como falta de coleta de lixo e ausência de iluminação pública, que dificultam a mobilidade e aumentam o risco de acidentes. A assistência foi suspensa após o deslizamento na Rua Canário, em 1º de maio do ano passado, que resultou em duas mortes. Marconi ressalta que, mesmo com estudos e projetos destinados à contenção dos morros, nada foi feito até agora.
– A presidenta eleita da Comissão de Políticas Públicas assinou, junto com o presidente Lula e o deputado federal Paulo Pimenta, a destinação de R$ 32 milhões para a Rua Canário. Já existe projeto, já tem o dinheiro liberado, mas a Prefeitura insiste em não agir. A gente não quer casa nova, só quer que façam a nossa vida segura aqui – disse o morador.
Quem passa pelo local também percebe o abandono de animais. Conforme os moradores, cerca de 25 cães e gatos vivem nas ruas. O cuidado tem sido de pessoas que ainda residem no local, com o apoio de ONGs como a Somos Pet.

Os moradores citam, também, a ausência de iluminação e buracos nas ruas que dificultam a chegada de um motorista de aplicativo ou até uma ambulância.
– Se alguém passa mal à noite, a ambulância nem entra. A Rua Canário está cheia de buracos e escura, e a gente vive com medo, sem apoio nenhum – acrescenta Marconi.

O tema virou pauta da Comissão de Políticas Públicas, Assuntos Regionais e Distritais (CPPARD) do Legislativo. O primeiro encontro ocorreu no dia 9 de outubro. Na oportunidade, o secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, Wagner Bitencourt, disse que as famílias não podem permanecer na Rua Canário porque estudos geológicos apontaram para o risco da área. A reunião contou com a presença de moradores de áreas como a Rua Canário.
O que diz a prefeitura
Em resposta às reclamações dos moradores, o secretário municipal de Habitação e Regularização Fundiária, Wagner Bitencourt, afirmou que o município não tem condições técnicas e legais de manter famílias na Rua Canário, classificada como área de risco e de parcelamento clandestino. Segundo ele, já foram realocadas cerca de 134 famílias, que agora vivem em locais seguros e regularizados. Já em relação às famílias que permanecem, o secretário explica que a prefeitura não pode levar infraestrutura básica como rede de esgoto, abastecimento de água ou iluminação pública para a área, devido à falta de viabilidade técnica e à localização em zona de preservação permanente.
Sobre o acúmulo de entulho, o Bitencourt garantiu que a limpeza será feita após a conclusão das demolições das residências restantes.
– Não é que o município não queira levar infraestrutura para a Rua Canário. O município não tem condições de levar. A área é irregular e está em uma zona de risco, onde não há viabilidade de instalar serviços como rede de esgoto, água tratada ou iluminação pública. As famílias que ainda permanecem na Canário são o que chamamos de retardatárias, ou seja, aquelas que não aceitaram participar dos programas de reassentamento – disse o secretário.
Ele também esclareceu que os moradores que não aderiram ao programa Minha Vida Reconstrução ainda poderão ser contemplados por meio do Minha Casa, Minha Vida, embora sem direito de escolha da unidade.
– Todas as famílias cadastradas terão direito a uma moradia. Nenhuma ficará sem atendimento – afirmou.
Quanto aos R$ 32 milhões citados por moradores, Bitencourt ressaltou que o recurso é do PAC Encostas e foi destinado ao Morro Cechela, não à Rua Canário:
– Não seria responsável aplicar esse valor em uma área onde restam poucas famílias, disse. Com R$ 30 milhões, podemos construir cerca de 150 moradias e atender um número muito maior de pessoas que também vivem em áreas de risco.
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